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50 anos da fundação da Bund Sozialistischer Arbeiter, seção alemã do Comitê Internacional da Quarta Internacional

Publicado originalmente em 19 de setembro de 2021

Ulrich Rippert é Secretário Nacional do Partido Socialista pela Igualdade (SGP) na Alemanha e foi membro fundador do seu predecessor, o Bund Sozialistischer Arbeiter (Liga dos Trabalhadores Socialistas) em 1971. Esta é uma versão editada de seu discurso em 19 de setembro no último comício eleitoral do SGP, que está concorrendo às eleições do parlamento federal (Bundestag) e da Câmara dos Deputados de Berlim com base em um programa socialista.

50 anos atrás, em 18 e 19 de setembro de 1971, o Bund Sozialistischer Arbeiter (BSA) foi fundado como a seção alemã do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI). Esse foi um evento de grande significado histórico.

26 anos após a queda da ditadura nazista, jovens trabalhadores e estudantes estavam se reconectando com as poderosas tradições marxistas que tiveram origem aqui na Alemanha. Foi aqui que o Partido Social Democrata (SPD) foi construído como o primeiro partido marxista massivo e o Partido Comunista Alemão (KPD) como o maior partido comunista fora da União Soviética. Porém, a socialdemocracia, o stalinismo e o revisionismo pablista traíram essa tradição.

Em 1938, Leon Trotsky fundou a Quarta Internacional para defender a perspectiva da revolução socialista mundial contra o stalinismo. A Quarta Internacional também tinha uma seção forte na Alemanha. Mesmo após o fim da ditadura nazista, apenas no grupo de Berlim, liderado por Oskar Hippe, havia mais de 50 membros.

Conferência de fundação da Liga Socialista da Juventude, a organização da juventude do BSA, 1972.

Porém, os seguidores de Michel Pablo e Ernest Mandel destruíram a seção alemã. Eles dissolveram a seção em 1951 no efêmero Partido Independente dos Trabalhadores da Alemanha, que apoiou o líder iugoslavo, Josip Tito, e depois a liquidaram no SPD e nos sindicatos. Oskar Hippe foi preso pelo regime stalinista da Alemanha Oriental, permanecendo preso por oito anos.

A Quarta Internacional foi defendida durante esse período pelas seções americana, britânica e francesa, que fundaram o Comitê Internacional da Quarta Internacional em 1953. Nos anos 1960, a tarefa de defender os princípios do trotskismo estava cada vez mais centrada na seção britânica, a Socialist Labour League (SLL, Liga Operária Socialista), cujo líder, Gerry Healy, participou pessoalmente da conferência de fundação da BSA.

Entre as duas dezenas de membros fundadores que se reuniram em Hannover naquela época, eu era um deles ‒ poucos tinham mais de 25 anos de idade. O que nos atraiu ao Comitê Internacional da Quarta Internacional foram três grandes questões.

A primeira foi a análise de Trotsky sobre o nacionalsocialismo (nazismo).

Como foi possível tal relapso à barbárie em um país moderno com uma cultura poderosa e uma forte tradição operária socialista é uma questão que preocupava toda uma geração na época.

Após a guerra, os crimes dos nazistas haviam sido encobertos. Porém, nos anos 1960, isso não era mais possível. O julgamento de Auschwitz em Frankfurt, no qual, pela primeira vez, um tribunal alemão condenou genocidas dos campos de extermínio, e documentários como “A noite cairá” trouxeram a uma audiência de milhões de pessoas a escala monstruosa do terror nazista.

Muitos na época explicaram a causa do fascismo em termos da psicologia das massas e da natureza crédula dos alemães, mas nós não ficamos satisfeitos com essa resposta. Os escritos de Trotsky nos mostraram que a causa fundamental era o fracasso da liderança proletária.

O SPD e o KPD possuíam milhões de eleitores e centenas de milhares de membros ativos. Eles haviam recebido muito mais votos do que os nazistas nas últimas eleições do Reichstag antes da chegada ao poder de Hitler (novembro de 1932). Os seus membros estavam ansiosos para deter os nazistas, mas os líderes do partido se recusaram a lutar.

O SPD contou com o Estado, a polícia e o presidente do Reich, von Hindenburg ‒ que nomeou Hitler chanceler menos de três meses após a eleição! O KPD, completamente submetido à influência de Stalin, escondeu a sua covardia com frases radicais. O partido chamou os socialdemocratas de socialfascistas e se recusou a lutar, como Trotsky e seus seguidores exigiam, por uma frente unida contra os nazistas.

Assim, Hitler conseguiu estabelecer a sua ditadura sem uma revolta da classe trabalhadora, a única força social que poderia tê-lo impedido.

Com base nos escritos de Trotsky, compreendemos também a conexão inseparável entre o fascismo e o capitalismo. A classe dominante alemã havia promovido Hitler, financiado, nomeado chanceler do Reich e ‒ com a Lei de Concessão de Plenos Poderes ‒ tornado ditador. Ela fez isso porque precisava de Hitler e suas hordas de camisas pardas para esmagar o movimento operário e realizassem o seu sonho imperialista do “espaço vital no Oriente”.

Concluímos que o perigo do fascismo não havia sido superado enquanto o capitalismo continuasse a existir. Ernest Mandel tomou a posição contrária na época. Ele escreveu no prefácio de uma edição alemã dos escritos de Trotsky que não se deve ficar “fascinado por um perigo [fascista] que ainda não existe, e deve-se gritar menos sobre o neofascismo”.

Por outro lado, nós estávamos convencidos de que somente a construção de uma nova liderança marxista na classe trabalhadora poderia evitar um relapso à guerra e à ditadura ‒ uma avaliação que foi confirmada dramaticamente nos últimos anos pelo surgimento do Alternativa para a Alemanha (AfD) de extrema-direita, a tentativa de golpe de Estado de Trump nos EUA, e acontecimentos similares em outros países capitalistas.

A segunda foi a adesão do Comitê Internacional à avaliação de Trotsky do stalinismo como uma agência contrarrevolucionária do imperialismo mundial.

O programa de fundação da Quarta Internacional havia previsto: “Ou a burocracia, que está se tornando cada vez mais o órgão da burguesia mundial no Estado operário, irá derrubar as novas formas de propriedade e jogar o país de volta ao capitalismo, ou a classe trabalhadora irá esmagar a burocracia e abrir o caminho para o socialismo”.

Essa questão estava no centro da ruptura da Quarta Internacional em 1953. Com uma avaliação superficial das nacionalizações no Leste Europeu, Pablo, Mandel e seus seguidores haviam concluído que o stalinismo estava novamente desempenhando um papel progressivo; a transição para o socialismo se desenvolveria ao longo de “séculos de estados operários degenerados”, como havia surgido na Leste Europeu. Em termos práticos, isso era equivalente à liquidação do movimento trotskista nos partidos stalinistas.

O Comitê Internacional rejeitou isso firmemente. Ele chamou o stalinismo de “o principal obstáculo” à revolução socialista. O stalinismo usou o prestígio da Revolução de Outubro de 1917 para atrair os trabalhadores e, em seguida, levá-los a ilusões sobre o capitalismo e à apatia. O preço por essas traições seria pago pela classe trabalhadora sob a forma do fortalecimento das forças fascistas e de novas guerras.

A supressão da revolta dos trabalhadores de 17 de junho de 1953 na República Democrática Alemã (Alemanha Oriental), a sangrenta supressão da Revolução Húngara em 1956 e da Primavera de Praga em 1968 confirmaram o caráter reacionário do stalinismo.

A terceira e mais importante questão foi a adesão do Comitê Internacional ao papel revolucionário da classe trabalhadora e ao internacionalismo.

As décadas de 1960 e 70 foram marcadas por uma profunda contradição. Houve uma onda internacional de lutas de classe militantes e revoltas coloniais, que ‒ como a greve geral de 1968 na França ‒ assumiu proporções revolucionárias. Porém, as massas eram politicamente dominadas por movimentos reformistas, stalinistas e nacionais que defendiam o capitalismo.

Na Alemanha, o SPD, que havia rompido formalmente com o marxismo em 1959 no Programa de Godesberg, atingiu o auge da sua influência em 1972, com mais de um milhão de membros e um resultado de 46% nas eleições federais.

Entre os jovens estudantes, que também se radicalizaram durante esse período, prevaleciam concepções políticas que tiravam as conclusões mais pessimistas sobre a ordem nazista e a Segunda Guerra Mundial e responsabilizaram a classe trabalhadora por elas.

Max Horkheimer e Theodor Adorno, as duas principais figuras da Escola de Frankfurt, referiam-se aos trabalhadores como “anfíbios”, que estavam completamente entorpecidos pelo trabalho na linha de montagem. “A impotência dos trabalhadores não é apenas um truque dos governantes, mas a conseqüência lógica da sociedade industrial”, escreveram eles em Dialética do Esclarecimento.

Os estudantes rebeldes não entendiam a “revolução” como um movimento socialista da classe trabalhadora, mas como a libertação das convenções sexuais e de outras convenções da sociedade burguesa. Muitos se empolgavam com a “revolução cultural” de Mao Tse Tung, um stalinista convicto, ou com movimentos nacionais como os Vietcongues e a OLP. Outros tomaram o “longo caminho através das instituições” e se tornaram eventualmente ministros.

Nós rejeitamos tudo isso, insistindo que a questão crucial era a construção de uma liderança revolucionária na classe trabalhadora. Enquanto todas as outras tendências políticas estavam se adaptando ao meio nacional, insistimos que a construção da Internacional tinha prioridade e era uma precondição para a construção da seção nacional.

Ulrich Rippert discursa na conferência anual da Juventude Socialista britânica em 1977

Gerry Healy falou muito poderosamente sobre essas questões na conferência de fundação da BSA em 1971. Apenas um mês antes, o presidente americano Richard Nixon pôs fim surpreendentemente ao acordo de Bretton Woods, que havia sido a base do sistema monetário mundial desde o fim da guerra. Healy demonstrou que nenhuma das contradições que haviam levado às duas guerras mundiais e ao fascismo haviam sido resolvidas. Todos os esforços precisavam ser concentrados na preparação da classe trabalhadora para uma nova época de luta revolucionária através da construção da Quarta Internacional.

Em meados dos anos 1970, a burguesia conseguiu bloquear a onda de lutas operárias militantes com o auxílio dos aparatos socialdemocratas e stalinistas. Ela lançou uma contraofensiva que continua até os dias de hoje.

Essa contraofensiva assumiu não apenas formas sociais e econômicas, mas também ideológicas. Formas extremas de idealismo subjetivo e irracionalismo ganharam força nas universidades, rejeitando não apenas o materialismo histórico, mas também as idéias do Iluminismo.

Isso intensificou a pressão política sobre o Comitê Internacional. A sua seção francesa, a OCI, já havia rompido com o Comitê Internacional em 1971. Ela se voltou para o Partido Socialista de François Mitterrand, onde seus quadros fizeram carreiras de sucesso. Um deles, Lionel Jospin, mais tarde se tornou primeiro-ministro francês.

O grupo Internationale Arbeiterkorrespondenz, que a OCI havia construído na Alemanha nos anos 1960, foi desfeito. A maioria entrou no SPD e se adaptou ao seu anticomunismo. A minoria fundou a BSA.

Então, no decorrer dos anos 1970, a seção britânica, hoje chamada Workers Revolutionary Party (WRP, Partido Revolucionário dos Trabalhadores), também capitulou ao pablismo contra o qual havia lutado nas décadas anteriores. Ele colocou seus interesses nacionais, oportunistas acima da Internacional e formou ligações sem princípios com os movimentos nacionais burgueses, a burocracia sindical e a burocracia do Partido Trabalhista.

Isso tornou os primeiros anos da BSA enormemente difíceis. O WRP exerceu grande pressão sobre nós, mas não estávamos prontos para desistir dos objetivos pelos quais havíamos fundado a BSA. Na divisão de 1985-86 entre o WRP e o CIQI, A BSA apoiou as críticas da Liga dos Trabalhadores, liderada por David North, e se manteve unida ao lado do Comitê Internacional.

Desde então, as perspectivas do Comitê Internacional têm sido justificadas em um grau extraordinário, e ele tem feito enormes avanços políticos.

A questão da natureza contrarrevolucionária do stalinismo foi decidida definitivamente há 30 anos. Com a dissolução da União Soviética e a transformação capitalista da China, a burocracia, conforme previsto por Trotsky, havia lançado o Estado operário de volta ao capitalismo.

Os partidos socialdemocratas e os sindicatos não defendem mais nem mesmo a aparência de uma reforma social. Eles organizam cortes sociais e reprimem qualquer resistência a eles.

O pablismo e suas variantes se integraram plenamente ao aparato de governo burguês. Eles possuíram ou possuem cargos em governos burgueses em vários países ‒ como Itália, Grécia, Brasil e Espanha. Na Alemanha, eles são membros do partido A Esquerda (Die Linke) ou estão entre seus deputados no Bundestag (parlamento federal).

Com exceção do nosso partido internacional, o Comitê Internacional, não há no mundo de hoje nenhuma tendência política que represente os princípios marxistas e um programa socialista internacional. É esse programa que está hoje desenvolvendo um grande apelo e se tornando a base para a construção de partidos socialistas massivos. Com o World Socialist Web Site, criamos um órgão de publicação diária que já é reconhecido mundialmente como a autêntica voz do socialismo.

50 anos é muito tempo na vida de uma pessoa, mas não na história. 76 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, está mais claro do que nunca que nenhum dos problemas que levaram à maior catástrofe da história da humanidade foi resolvido.

Com as suas políticas desumanas em reposta ao coronavírus, que colocam o lucro e os interesses econômicos acima da proteção da saúde e da vida, a classe dominante capitalista mostra que está avançando novamente por cima de cadáveres. As estruturas democráticas estão entrando em colapso em todos os lugares, e as forças fascistas estão sendo promovidas pela classe dominante.

Após 30 anos de guerras devastadoras no Oriente Médio e na África, os EUA e seus aliados estão preparando uma guerra contra a China, que seria travada com armas nucleares e destruiria a humanidade. A Alemanha também está novamente empenhada em um programa agressivo de rearmamento militar.

Entretanto, a mudança mais importante na situação atual é o retorno da luta de classes. As greves estão se desenvolvendo e a resistência está crescendo em todo o mundo. Em todas essas lutas, a questão da liderança política surge com grande urgência. A construção do CIQI e do Partido Socialista pela Igualdade são as tarefas mais importantes. O futuro depende da derrubada do capitalismo pela classe trabalhadora.

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